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Mudanças no FIFA RSTP: impactos do Caso Diarra

  • cantoeidelveinadvo
  • 21 de fev.
  • 4 min de leitura

  1. Introdução


No dia 04/10/2024, o Tribunal de Justiça da União Europeia (CJEU) emitiu decisão no caso C-650/22, conhecido como "Caso Diarra". Essa decisão desencadeou a necessidade ajustes no sistema regulatório da FIFA no que tange à estabilidade contratual e à emissão de Certificados de Transferência Internacional (ITC). A decisão do CJEU afetou principalmente o artigo 17 do RSTP e os Anexos 2 e 3 do referido regulamento da FIFA.


Dentro deste contexto, a FIFA estabeleceu diálogo com stakeholders do futebol e, em 22/12/2024, formalizou um marco regulatório provisório, com vigência a partir de 01/01/2025. Esse conjunto de normas temporárias buscou garantir segurança jurídica nas relações entre jogadores, treinadores, clubes e federações durante o período de transição para uma nova estrutura regulatória definitiva. 


Contudo, destaca-se que essas alterações não representam uma versão final do RSTP, mas visam assegurar a aplicação uniforme das normas da FIFA enquanto são discutidas mudanças definitivas neste. Além disso, apesar da introdução de novas diretrizes, os conceitos regulatórios básicos sobre a estabilidade contratual, sobre o princípio do período protegido e sobre a necessidade da emissão de um ITC para transferências internacionais, continuam em vigor. 


  1. Principais alterações do RSTP


  1. Definição de "justa causa" para rescisão contratual


A FIFA incluiu no artigo 14, parágrafo 1, do RSTP uma definição geral de "justa causa". A nova redação estabelece que uma parte pode rescindir um contrato sem consequências financeiras ou sanções esportivas quando não puder mais, de maneira razoável e de boa-fé, continuar a relação contratual. Embora essa definição já fosse aplicada pelo Tribunal do Futebol, sua inclusão formal no regulamento aumenta a previsibilidade para clubes, jogadores e treinadores.


  1. Cálculo da Compensação pela rescisão do contrato


As novas disposições regulatórias alteram a metodologia de cálculo da compensação prevista no artigo 17, parágrafo 1, do RSTP. A compensação deve ser fixada com base no dano sofrido, considerando o princípio do "interesse positivo". Busca-se, assim, restaurar a parte lesada à posição em que estaria caso o contrato tivesse sido cumprido. 


A nova abordagem retira da base regulatória critérios específicos de cálculo considerados problemáticos pelo CJEU, tornando a avaliação dos danos mais objetiva e transparente. Adicionalmente, a FIFA removeu a exigência de que fosse considerada a "especificidade do esporte" no cálculo da compensação, reforçando a necessidade de considerar os fatos e circunstâncias individuais de cada caso.


Essencialmente, as mesmas mudanças foram realizadas para as normas aplicáveis às disputas envolvendo treinadores, especialmente no que se refere ao artigo 6, parágrafo 2, do Anexo 2 do FIFA RSTP.


  1. Ônus da prova em relação à responsabilidade solidária para o pagamento da compensação pela rescisão do contrato


O artigo 17, parágrafo 2 do RSTP foi modificado para estabelecer que um clube só será considerado solidariamente responsável pelo pagamento de compensação caso tenha induzido um jogador a romper o contrato. Antes, o clube que contratava um jogador que havia rescindido um contrato de trabalho era considerado automaticamente responsável solidário pelo pagamento da indenização ao clube anterior. Agora, para que seja reconhecida a responsabilidade solidária, cabe ao clube que se sente prejudicado provar que houve indução à rescisão contratual. 


  1. Ônus da prova no que tange à indução à rescisão do contrato


Nos casos de indução à rescisão do contrato, o novo sistema regulatório também altera o artigo 17, parágrafo 4 do RSTP, estabelecendo que um clube só será sancionado esportivamente se for provado que induziu um jogador a romper seu contrato durante o período protegido. Isto é, deverão ser consideradas os fatos e as circunstâncias individuais de cada caso. Esse ajuste garante que as penalidades sejam aplicadas de maneira mais justa e baseada em evidências concretas.


  1. Ônus da prova: dever de colaboração 


O sistema regulatório provisório também introduziu, no Regulamento de Procedimentos da FIFA, o dever de colaboração para as partes envolvidas em disputas contratuais. Agora, as partes devem responder de boa-fé a pedidos de prova apresentados pelo Tribunal do Futebol, pela Secretaria Geral da FIFA ou pela outra parte. Caso contrário, o Tribunal pode tirar conclusões desfavoráveis contra a parte que se recusar a colaborar.


  1. Modificação no Processo de Emissão de ITCs


Foi modificado também o processo de emissão dos Certificados de Transferência Internacional (ITC), estabelecendo que:


  • A associação nacional do clube anterior deve emitir o ITC em até 72 horas após o pedido realizado pela nova associação;

  • Se a associação nacional do clube anterior não responder dentro do prazo, o jogador poderá ser registrado pelo novo clube e as informações do registro pertinente do jogador poderão ser inseridas no TMS;

  • Não é mais possível a associação anterior do clube anterior recusar a emissão do ITC, contudo, será possível, em circunstâncias excepcionais pedir a intervenção da FIFA;

  • Em todos os casos, a emissão de um ITC não prejudicará qualquer disputa contratual entre o jogador, seu antigo clube e/ou seu novo clube.


Essa mudança garante que disputas contratuais não possam ser usadas para bloquear transferências internacionais, alinhando-se às diretrizes estabelecidas na decisão do CJEU.


  1. Casos Pendentes no Tribunal do Futebol


Os casos que estavam em andamento no Tribunal do Futebol antes da entrada em vigor do novo regulamento serão decididos com base nas novas regras. No entanto, as partes envolvidas terão direito a serem ouvidas para garantir que suas posições sejam levadas em consideração.


  1. Próximos Passos


Segundo comunicado emitido pela FIFA, a entidade continuará o diálogo com os stakeholders para desenvolver um novo regulamento permanente para o RSTP. O objetivo é criar uma estrutura jurídica robusta, transparente e não discriminatória, equilibrando os interesses dos jogadores, treinadores, clubes e demais entidades do futebol global.


O marco regulatório provisório entrou em vigor em 01/01/2025 e será mantido até que um novo conjunto de regras permanentes seja aprovado.


  1. Considerações finais


A implementação dessas mudanças reflete a necessidade de a FIFA formular regras que possibilitem a estabilidade e previsibilidade nas relações havidas no futebol internacional. O marco regulatório provisório busca, assim, proporcionar segurança jurídica para jogadores, treinadores, clubes e federações, enquanto a FIFA trabalha em uma solução definitiva.



O escritório Canto & Eidelvein Advogados está à disposição para esclarecer dúvidas relacionadas a este artigo e a qualquer assunto relacionado à área.


Diego Eidelvein do Canto

Advogado e sócio do escritório Canto & Eidelvein Advogados, especialista em Direito Desportivo.


 
 
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